Na véspera de Natal, Dª. Teresa desapareceu no shopping. Ela saíra de casa
cedo para escapar dos congestionamentos
comuns nessa época
do ano. Levava uma lista
com os inúmeros presentes
que pretendia comprar.
Estavam na relação os filhos, genros,
noras, o porteiro
do prédio, as empregadas,
as manicures, o professor de ginástica,
o terapeuta comportamental, os colegas da repartição
e pessoas que
a família ignorava mas,
de alguma forma, compunham o seu círculo de relações. Ela sempre
se sentira no dever de presentear
a todos.
O último
contato com
a família se dera por
volta das 13h30, via
celular. Quem
atendeu foi Tancredo, o marido. A mulher
estava numa das inúmeras filas que teria de enfrentar
naquele dia. Quase
não falou com
ele, tal
o burburinho na loja,
mas teve tempo
para o prevenir de que chegaria tarde,
muito tarde
(impressão ou
não de Tancredo, quando
ela disse “muito
tarde” havia um
cansaço misterioso na sua voz).
Como Dª Teresa não
voltava com o avançar da noite,
a família foi ao shopping averiguar.
Os vigias não
sabiam de nada. Tancredo e os filhos resolveram ligar para os amigos. Uma
das amigas vira Dª Teresa, por volta das 16h, mordiscando uma pizza
com refrigerante
na praça da alimentação.
Em volta,
ocupando umas três cadeiras,
havia inúmeras embalagens de presentes. A amiga
pensou em como
ela conseguiria transportar
tudo aquilo,
mas logo
deixou de lado a preocupação;
Dª Teresa era hábil
nesse tipo de tarefa.
Ia muito ao shopping, estava acostumada
a transportar pacotes.
Até circulara o rumor
de que ela
fazia terapia para
se curar da compulsão
por fazer compras.
A família comunicou o desaparecimento
à polícia, mas
foi inútil; ninguém
sabia de pistas que levassem à mulher. A polícia
sugeriu que ela podia não ter desaparecido no shopping,
mas fora
dele. O mais provável,
já que
levava um monte
de presentes, era
que tivesse sido raptada na saída. Mas ela não chegara
a sair. Seu carro continuava no pátio
do estacionamento – e o mais intrigante: cheio de embrulhos.
Dª Teresa cumprira o seu dever,
comprara o que tinha
de comprar, depois viera até o automóvel e guardara os presentes.
Por que,
então, não
voltou para casa?
Desalentados,
os familiares não sabiam mais o que fazer. Foi quando
alguém teve a ideia de examinar
os manequins. A proposta
parecia absurda, mas
foi aceita por falta
de alternativas. Policiais, familiares e
amigos iam de vitrine em vitrine olhando os bonecos, nus
ou vestidos, que
posavam por trás
das paredes de vidro.
De repente Leninha, uma das filhas, deu um berro que reverberou por
todo o shopping. “Não
é possível! Mamãe!”.
Correram todos. E viram! Viram que Dª
Teresa tomara o lugar
de um manequim
masculino vestido
de Papai Noel. Dura,
imóvel, ninguém
sabia se estava viva ou morta. Tinha o olhar parado, perplexo, e na fisionomia
uma expressão artificial
de riso. A família
deu por encerrado o mistério
e tratou de levá-la para casa.
Dª. Teresa foi carregada, como um presente, sem despregar do rosto o sorriso
enigmático.
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