sexta-feira, 14 de março de 2025

Adeus a Affonso

 


Affonso Romano de Sant’Anna aliava o conhecimento da literatura ao talento para a criação literária (foi ensaísta, cronista, poeta).

Como estudioso, pesquisou as matrizes de dois procedimentos que se refletiram em muito da nossa produção – a paráfrase e a paródia. Esta última categoria, trabalhada em alguns dos seus textos e brilhantemente explorada nas aulas, levou-nos a compreender melhor a obra de um Oswald de Andrade, um Drummond ou um Mário Quintana (para citar alguns exemplos).

Politicamente, preferia questionar “que país este” a propor estratégias de engajamento social, fazendo desse questionamento um estímulo para que se pensasse além do simplismo das ideologias. 

Os cursos que fiz com ele na Pós-Graduação da UFRJ ajudaram-me a entender a literatura como um continuum no qual as rupturas são muitas vezes retomadas de procedimentos anteriores. Num deles, sobre literatura e carnavalização, escolhi apresentar na avaliação final monografia sobre o romance “A verdadeira estória de Jesus”, de Waldemar Solha, inserido no corpus a ser analisado.

Não deixa de ser curioso que ele tenha morrido durante o Carnaval, tema que abordava em suas aulas sobre a “sátira menipeia” – protótipo da “inversão” presente nos festejos dessa festa pagã e profana que realça a feição contraditória do nosso espírito. 

Evoé, Affonso, misto de gentleman e disfarçado folião! Se outro mundo existe, foste recebido não por um coro angelical, mas por uma trupe de mascarados que escondem sob o disfarce o que há de intensamente humano em nós. 

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