O
bullying sempre existiu no ambiente escolar. É uma prática que reflete a
natural tendência do ser humano a julgar, ou mesmo rejeitar, os que lhe parecem
inferiores do ponto de vista físico ou intelectual. Entre os adolescentes, que
passam por transformações que lhes fragilizam a personalidade, o bullying pode
ter efeitos desastrosos. Um desses efeitos – o assassínio de uma garota por um
colega de classe – é o tema da série “Adolescência”, que atualmente lidera a
audiência na Netflix.
Muito
já se escreveu a seu respeito, de modo que fica difícil dizer algo novo.
Falou-se, por exemplo, sobre a filmagem de cada episódio num único
plano-sequência, o que concorre para fazer o espectador “participar” da
história. Ou sobre o sensível trabalho dos atores, exigidos ao máximo devido à
maneira como a série é filmada.
O
que mais me chamou a atenção foi a forma como os roteiristas expressam as
razões pelas quais o garoto Jamie comete o crime. Sabe-se que elas dizem
respeito tanto ao ambiente escolar quanto à negligência da família – mas isso
só fica bem claro no fim.
O
roteiro não enfatiza ao longo da trama nenhuma das duas. Dá indicações,
mostrando por exemplo a indisciplina de determinados alunos em classe diante de
professores que não são levados a sério, ou o temperamento violento do pai do
menino. Cabe ao espectador ir colhendo as evidências para atribuir o devido
peso a cada um desses motivos.
A
série é dolorosa, mesmo cruel, por mostrar que o ato de tirar a vida da garota
foi a resposta a um profundo sofrimento interior. Jamie investiu contra alguém
que lhe ressaltara a condição de “incel” (involuntariamente celibatário),
confinando-o a uma desesperadora solidão. Isso obviamente não justifica o
crime, mas dificulta a atribuição de responsabilidade e concorre para que se
veja o menino como algoz e também vítima.
O reconhecimento dessa dualidade se espelha nos olhos horrorizados da psicóloga que o interroga no lancinante terceiro capítulo – o melhor da série. Ela convive com o garoto durante quatro sessões marcadas por alternâncias de humor e uma violência ora contida, ora expressa por acusações de ambas as partes. Sua impotência para fazer um julgamento adequado, mesmo percebendo-lhe a culpa, acaba desmoronando-a emocionalmente.
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