domingo, 7 de agosto de 2011

Modismo e destino

A moda assemelha-se às doenças – pega. Ninguém sabe que moda vai pegar, ou do que vai adoecer. Instalado o processo patológico, no entanto, desfaz-se a ideia de acaso ou gratuidade. No imenso mar da perplexidade moderna, a moda é a marola que se encrespa mais pelo brilho, mais para se deixar ver ao enorme sol da vaidade, e depois murcha na anônima superfície do tempo. O que é a moda, senão a eternidade do efêmero?
O curioso é que a moda tem invadido territórios onde antes se percebia alguma inflexibilidade e um louvável rigor. Certas hábitos ou certas coisas – como o ritual da sedução amorosa, os vestidos das mulheres ou as gravatas dos homens – podem e devem variar. É da sua própria natureza substituir-se, alternar-se conforme o gosto das pessoas e o fluir das estações. Já outros tipos de prática ou de mercadoria deviam permanecer infensos a mudanças.
Tomemos o caso da medicina. Há alguns anos debitava-se tudo ao psicossomático. Uma gripe, uma diarreia, ou mesmo um câncer eram o resultado de complexas interações psicológicas e físicas. E não se adoecia do corpo, adoecia-se basicamente da alma. Hoje, conforme atroam os meios de comunicação ressoando a verdade dos laboratórios, hoje tudo é genético. Diariamente os cientistas descobrem um novo gen que comanda alguma coisa. E os cromossomos, ficamos sabendo com estupor, cada vez mais dispõem sobre o nosso destino.
Já se chegou a isolar o gen que determina a opção político-ideológica das pessoas. O indivíduo já nasceria codificado para ser direita ou esquerda, petista ou neoliberal. Se tudo é genético, como fica o problema da consciência e do livre-arbítrio? Então vivemos apenas para realizar um percurso predeterminado, submetidos a um código transcendente aos nossos sonhos, projetos e intenções?
Calma, leitor. Antes de tudo, reflete que essa tirania da genética é também um modismo. Daqui a algum tempo, vai-se descobrir um “princípio ativo” subjacente ao código genético e capaz de modificá-lo em função das nossas disposições anímicas. Será a volta triunfal ao psicossomático.
Além do mais, mesmo se considerando que os gens programam os nossos sentimentos e dispõem sobre as nossas ações, quem disse que determinismo é destino? Às vezes levamos a vida a lutar contra os nossos determinismos e fazemos dessa luta inglória, mas nem sempre vã, o nosso destino. Diferente do determinismo, que representa um conjunto de fatores vindos de fora, o destino sempre envolve o indivíduo. Sempre envolve o eu. Digamos que o destino reflete a maneira aquiescente, ou contrastante, segundo a qual reagimos ao que nos molda biologicamente.
E se falo essas coisas, meio por falta do que dizer, é que esse tipo de assunto – situado entre a frivolidade e a filosofia -- nunca sai da moda.

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