Ir ao cinema e comer pipoca é hoje
praticamente sinônimo. Comumente se veem nas filas de entrada pessoas com sacos
ou mesmo caixas de pipoca, que tratarão de devorar enquanto assistem às
sessões. De onde veio essa mania eu não sei, mas certamente ela se liga ao
interesse dos donos dos cinemas por dinheiro. A venda desse tipo de guloseima,
segundo li, tem feito pipocar os lucros.
Pipoca não é alimento e até faz mal à saúde. Entra em
sua composição a tal gordura vegetal hidrogenada, que se impregna nas artérias
mais do que a gordura animal. Quando vejo aqueles sujeitos sentados com um
enorme pacote no colo, fico pensando se chegarão ao fim do filme sem terem um
infarto. É muita gordura e muito sal ingeridos durante quase duas horas – e
ainda mais numa postura sedentária. Quando algum deles se levanta não é para
esticar as pernas, mas para comprar outro pacote – ou balde!
Mas, enfim, isso é lá com eles. Cada um sabe o que faz
à saúde, e muitos preferem sacrificá-la a abdicar de um pequeno prazer. O
problema é que a pipoca, se satisfaz o paladar de quem a come, pode ser um
terrível inconveniente para os outros. Experimente assistir um filme ao lado de
quem está comendo esses minúsculos objetos crocantes.
A deglutição deles passa por etapas penosamente
acompanhadas por quem está perto. Primeiro vem a trituração, que produz
estalidos semelhantes aos de madeira sendo picotada (ou ao crepitar de faíscas
numa fogueira). Depois vem a mistura do produto com a saliva, a qual não se dá
facilmente pois muito do que parecia triturado tem ainda uns resíduos de milho
e precisa ser quebrado de novo. Por fim vem a deglutição propriamente dita, que
soa como um gorgolejo devido ao líquido a ela associado (pipoca sem
refrigerante não tem graça).
Toda essa operação é acompanhada pelo vizinho, que
tenta inutilmente acompanhar o filme e termina engolindo em seco. Não adianta
olhar de lado e dar a entender que sente o incômodo, pois ninguém é mais
indiferente aos outros do que alguém que come pipoca no cinema. A mastigação
ritmada, o trabalho sucessivo com as mãos, o odor levemente acre da manteiga e
do milho funcionam como um anestésico. A pessoa chega a se alhear do que passa
na tela. A pipoca literalmente rouba a cena.
Às vezes deixo de ir ao cinema com medo de que, junto
de mim, se abolete um desses comedores compulsivos. Nem sempre há cadeiras
vazias para a gente sentar em outro canto, e ver o filme com tal vizinhança é
uma prova de paciência pela qual poucos conseguem passar.
Sei que deve haver mais pessoas como eu, por isso faço
um apelo. Vamos lutar para que se aplique aos comedores de pipoca o que se
aplica aos fumantes, ou seja, a destinação de um lugar específico. Eles
ficariam separados por um revestimento acústico de quem entrou no cinema com
o nobre e salutar objetivo de ver o filme. Afinal é para isso que se paga o ingresso, e não
para suportar o incômodo dos estão ali não por razões lúdicas ou estéticas, e sim para satisfazer um tipo mais rudimentar de fome.
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