Donaldo Trump apresentou durante vários anos o programa “O aprendiz” na NBC americana. Nele o ex-presidente avaliava candidatos que pretendiam vencer no mundo corporativo, medindo-lhes atributos como ousadia, planejamento, espírito empreendedor. Caso o candidato se mostrasse inapto em um desses quesitos, receberia do apresentador uma sentença que acabou virando um bordão: “Você está demitido!”.
Há alguns dias a América demitiu Trump.
O povo americano derrotou-o em eleições limpas e, tudo indica, pode impedi-lo
de se candidatar em próximos pleitos. O que deu errado na estratégia do guru empresarial
que, na gerência do governo americano, não foi capaz de revelar alguns dos
atributos que costumava cobrar de outras pessoas?
Li
que a maior influência na formação do ex-presidente veio do seu pai. O velho detestava
perder e inculcava esse temor nos filhos. Queria que cada um deles fosse um
“matador” – metáfora que sugere a disposição feroz e inclemente de vencer mesmo
ao custo de destruir os adversários.
A
lição paterna frutificou no menino Trump, que passou a cultivar a obsessão do triunfo
a qualquer preço e custo. Essa mentalidade até pode funcionar no mundo corporativo,
onde eventuais rasteiras nos adversários ficam circunscritas aos limites das empresas.
Mas é extremamente arriscada no universo político, que exige de seus atores um
amplo compromisso com a coletividade. Para medir a prática desse compromisso
existe a imprensa, que tende a esquadrinhar com um faro de pitbull faminto o
comportamento dos eleitos.
A
derrota de Trump não deixa de representar uma lição. Mostra que a luta pelo poder
não é um vale-tudo no qual a mentira, o cinismo e a arrogância vigoram
impunemente. O presidente derrotado sustentou até onde pôde a mentira de que
houvera fraude nas apurações. Ou melhor, até onde ficou claro o objetivo dessa inverdade:
incutir nos aliados uma indignação que os levasse a um protesto radical, como foi
a invasão do Capitólio. Cego para permanecer no poder, Trump não percebeu o
risco e a gravidade de tal sublevação, da qual resultaram tiros, depredações e
mortes.
Fala-se
agora que, voltando aos negócios, ele deve investir num canal de TV. Ou
comandar uma nova versão de “O aprendiz”, desta vez acoplando o programa ao seu
propósito de voltar à Casa Branca em 2024. Essa possibilidade não deixa de ser
irônica. Com que credibilidade ele vai dar conselhos às pessoas sobre como
serem profissionais vitoriosos? Isso implicaria preparar também para a derrota,
o que o ex-presidente mostrou que não sabe fazer. Ele perdeu feio e mal,
possivelmente sepultando uma carreira que poderia ter continuidade caso o
fracasso fosse encarado como um acidente de percurso. A empáfia e a cega
obstinação pela vitória não o permitiram enxergar isso.
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