1
As palavras têm significados. Escrever bem é juntá-las da melhor
maneira para que tenham um sentido. Como não há palavras neutras, o mau emprego
ou o excesso delas pode arruinar esse propósito. Daí a necessidade de suprimir
as que não funcionam, cortá-las sem clemência, a fim de não comprometer o valor
das que contam. O texto é como um jardim; quanto mais se poda, melhor
floresce.
2
O corpo pode ser tanto objeto de
enlevo e prazer sexual quanto instrumento de ofensa e agressão. Cheiros,
orifícios, excrementos podem servir de referências grosseiras para depreciar os
outros. Nesse caso o corpo anatômico triunfa sobre o corpo erótico ou
pulsional. A isso corresponde o vocabulário dito chulo (pornográfico), que
mostra sem disfarces o lado feio da nossa anatomia.
3
A devoção
conforta independentemente do objeto a que se destina. Subtrai-nos à
gratuidade, que sempre é motivo de inquietação. A entrega a uma crença, um
projeto, uma pessoa dá-nos a sensação de que possuímos a nós mesmos. Peregrino
da liberdade, o homem parece que só se tranquiliza quando a ela renuncia. Mas é
preciso escolher bem em prol de quê fará isso.
4
O humor comporta alguma dose de sadismo
(ri-se de algo ou de alguém). Mas é um sadismo benigno, que aponta falhas e
desproporções para corrigi-las, e não para satisfazer a perversão. O sádico
inflige dor a outrem visando unicamente ao próprio prazer. O humorista quer que
os outros riam.
5
No jogo da
vida, chega o dia em que o “tempo regulamentar” esgota e ficamos... por conta
do juiz. Só nos resta torcer para que ele vá esquecendo o apito.
6
Os livros que nos marcaram são por nós
continuamente reinterpretados. Não precisamos relê-los para lhes atribuir novos
sentidos. À medida que deles nos distanciamos no tempo, mais os sentimos
próximos. A maturidade nos faz descobrir o que não tínhamos percebido em
leituras anteriores. Os bons livros são sementes que em nós se multiplicam e
nos fazem crescer.
7
Falar dos outros é catártico. Quando
fazemos isso, nos compensamos do que não conseguimos fazer (e ser). Alguém já
se referiu à utilidade psicológica da fofoca, que nem sempre é verdadeira (mas
se for, melhor). A fofoca mostra que o ser humano vive em competição com os
outros. Saber de um traço negativo alheio traz-lhe uma obscura sensação de triunfo.
8
Vejo amigos se ressentindo de serem
pouco ou nada lidos por seus colegas escritores. O problema é que hoje muitos
escrevem, e o tempo é curto para ler tanta gente. Além disso, quem escreve está
mais interessado em ser lido do que em ler. Ainda assim, é preciso (e
inevitável) escrever. Mesmo que a recepção, o mais das vezes, se transforme em
decepção.
9
Se muitos pensam, poucos dominam. É claro, então, que a
disseminação do pensar não interessa aos dominadores. O pensamento é por
excelência o exercício da liberdade. Foi graças a ele que o ser humano passou a
conhecer, e eventualmente dominar, os mecanismos da Natureza. Diante disso, não
surpreende que os que pretendem se perpetuar no poder desprezem as práticas e
instituições que aprimoram no ser humano a capacidade de refletir. O que dá a
medida de um governo democrático é o quanto ele investe em ciência, cultura e
educação. Quanto mais burro o povo, mais ele se presta ao cabresto e menos
protesta contra os que querem lhe montar no lombo.
10
O ateu afirma Deus na medida em que, negando-o, exerce o direito à
liberdade que lhe foi conferido pelo Criador. A grandeza do ser
humano não se mede pela crença cega numa divindade, mas sim por quanto
essa crença o faz valorizar o próprio homem. Fora do humanismo não há
salvação.
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