Um amigo pediu à Inteligência Artificial que
produzisse um poema “ao estilo de Augusto dos Anjos”. Recebeu esta composição e
quer saber o que eu acho:
Nas veias, o sangue
pulsa impuro,
Um rio de tormento e
aflição.
O corpo, um templo
decadente,
Onde a vida se esvai
em vão.
Oh, Augusto dos
Anjos, mestre do lamento,
Tuas palavras ecoam
como pranto.
Descreves a angústia
da existência,
Num mundo de
desencanto.
Os ossos, frágeis
estruturas,
A sustentar a carne
em decomposição.
Somos meros espectros
ambulantes,
Em busca de uma
ilusória redenção.
A vida, um teatro
macabro,
Onde os atores são
marionetes.
E o palco é o cenário
derradeiro,
Das dores mais
secretas e inquietantes.
Augusto dos Anjos,
poeta maldito,
Tuas rimas ecoam na
escuridão.
Retratas a
efemeridade da vida,
Numa poesia de sombra
e solidão.
****
Como se vê, os versos
são bem ruinzinhos. Falta-lhes rigor métrico e a expressividade própria do
“Poeta do Eu”.
O simplismo das
imagens mostra um pastiche pouco criativo (pois sabemos que há os criativos),
por meio do qual “o autor” procura imitar a visão de mundo do poeta. Há uma
série de obviedades sobre o sofrimento e a transitoriedade humanos que está
longe de refletir o universo da culpa e da morte presente no “Eu”.
Dizer que o sangue é
“um rio de tormento e solidão” é impróprio e denota um profundo mau gosto. E o
fato de Augusto ter escrito “O lamento das coisas”, uma vigorosa representação da
energia que potencializa o desejo, não autoriza que o chamem de “mestre do
lamento” — como se a sua poesia não passasse de um rol de lamúrias.
Enfim, a IA ainda tem
muito que aprender para chegar ao nível do nosso poeta (se é que um dia
conseguirá isso).
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