domingo, 21 de outubro de 2012

Só no sonho

Sonhou que tinha um encontro amoroso com Camilinha, a namorada que havia alguns meses o rejeitara. Fazia tempo que não tinha um sonho tão bom. As imagens eram vivas, bem recortadas, o que acentuava a impressão de realidade.
Quando abriu os olhos e percebeu que era tudo sonho, ficou decepcionado. Seu desejo foi dormir de novo para reatar a fantasia, terminar o beijo, fechar com palavras doces o breve idílio encenado no fundo nebuloso de si mesmo. Mas era tarde, estava lúcido, e Camilinha se esvaíra com a claridade do dia.
Levantou-se meio entorpecido e foi fazer a barba, tomar café, tirar o carro da garagem para ir à repartição. Essas ações eram entremeadas com a lembrança de Camilinha rindo, usando roupas transparentes, puxando-o com energia para junto de si. Aproximavam-se do delicioso clímax quando súbito -- como se tivesse levado um soco ou uma ducha fria -- ele acordou.
- Cuidado, meu irmão! Tá sonhando?
Frearam bruscamente perto dele, que avançara o sinal. Acenou, desculpando-se, para o motorista. Pouco depois chegou ao trabalho, mas não conseguiu se concentrar. Ficou sentado no birô, olhando para outro lado, evitando a pilha de papéis que esperavam leitura e deliberação. Como podia deliberar alguma coisa se a imagem da mulher com o vestido transparente e os lábios entreabertos tomava conta dele?
No fim da tarde voltou para casa. Esquentou água para o chá verde, que era uma especial de ritual vespertino. Sentia-se cansado do esforço que fizera para trabalhar. Deitou-se pensando na noite passada. De repente, o telefone tocou. Era ela!
-- Oi. Ficou chateado comigo?
-- Como?!
--Sei que fui um pouco ousada, desculpe, mas de repente bateu uma saudade... Agarrar você foi um pouco demais, reconheço, mas não dava para resistir. Pena que você tivesse fugido na hora h.
- Fugir? - perguntou, perplexo. - Mas então... aconteceu mesmo? A gente se encontrou? Não foi sonho?
A garota pareceu surpresa: - Claro que não foi sonho. Foi super-real. E a gente precisa terminar o que começou. Você não topa?
- Topo, claro. Mas onde?
- Pode ser aí, no seu apartamento.
- Está bem, espero você. Venha logo.
Acordou com o som da campainha eletrônica. Certamente era Camilinha, que por sinal viera mesmo bem depressa. Devia estar ansiosa para cair em seus braços... Atendeu, um pouco trêmulo, e ouviu do outro lado a voz da síndica lembrando-lhe a reunião de logo mais à noite. Só então se deu conta de que sonhara de novo.
Não foi à reunião, nem a lugar nenhum. Preferiu ir dormir. Deitou-se cedo, com a firme convicção de que dessa vez nada atrapalharia o que estava para acontecer entre os dois.

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