A
mídia tem mostrado com uma frequência preocupante a violência no esporte. Cenas
de murros, tiros e facadas invadem os noticiários televisivos, fazendo-nos
admirar que gente pacífica ainda entre em campos de futebol. O mais doloroso é
que os alvos nem sempre são os torcedores, mas pessoas que eventualmente circulam
pelas cercanias dos estádios.
O
esporte existe para canalizar e reduzir a violência, mas o que temos visto
ultimamente é a violência transformada em esporte. Um dos motivos para isso é a
mística atribuída a certos clubes, cujos fanáticos torcedores os têm como
religiões. Ou melhor, têm-nos como seitas, pois as religiões exercem um papel
comunitário que essas agremiações estão longe de exercer.
A
identificação entre os componentes da torcida existe mais pada excluir os
diferentes do que aproximar os semelhantes. Ser Flamengo, por exemplo, é
rechaçar todos os que não torcem pelo clube; é considerar a derrota como uma
agressão imperdoável pela qual os torcedores do time vencedor devem pagar. Às
vezes com a vida.
Nessa
perspectiva, perde-se totalmente a noção do valor e a consideração da
qualidade. Deixa-se de reconhecer a superioridade do adversário, mesmo ela
existindo. A derrota infligida por ele não terá se devido ao mérito, mas a
alguma artimanha do “juiz ladrão”.
Querer
ganhar sempre é uma deformação psicológica. Vai de encontro à percepção de que
é natural na vida a alternância entre vitória e derrota. Só um egocentrismo
desvairado pode levar alguém a achar que se subtrai a essa lei.
Há
algum tempo o pleito presidencial americano nos ofereceu um vergonhoso exemplo
dessa presunção. Contra todas as evidências, Donald Trump não aceitou a
derrota. Alegava roubo na contagem dos votos para negar o resultado das urnas,
desmoralizando com isso a democracia americana. O resultado foi o que se viu:
invasão do Capitólio com feridos e mortos.
A
comparação com a política não aparece aqui à toa. Ela tem em comum com o
esporte a disputa e a ânsia de sobrepujar o oponente a qualquer preço. Em ambos os domínios há uma guerra que milênios
de civilização deveriam ter nos ensinado a sublimar.
Não
foi isso que ocorreu, e certamente jamais ocorrerá. Nas disputas pelo poder ou
pelo primeiro lugar no pódio, o que prevalece é o velho impulso de suprimir o
outro ou mostrá-lo inferior. Qualquer coisa menos do que isso soa como uma
desfeita ao ego soberano, que até hoje nenhuma religião conseguiu domar.
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