segunda-feira, 24 de abril de 2023

Mais anos, menos ilusões

Hoje completo 72 anos (mas não quero que saiam espalhando isso por aí). Tecnicamente sou um idoso, eufemismo que inventaram para “velho”. Tudo bem, “velho” pode ser mesmo pior, a não ser que o indivíduo pretenda no Natal se vestir de Papai Noel. Se for esse o caso ele terá uma justificativa para ostentar, como um bom velhinho, a cabeleira branca e aquela bonomia própria dos que querem estar em paz com o mundo. Ninguém vai reparar. 

A vida é uma ordem, como diz Drummond, e cumpre-nos aceitá-la com resignação e o propósito de fazer o bem. Tento isso o tempo todo, mas os outros não ajudam. A bondade é uma conquista difícil porque nem sempre encontra eco, nem reciprocidade, no ânimo das outras pessoas.

O bom de chegar à idade que hoje completo é ter perdido as ilusões. Iludir-se falseia a ideia de felicidade e nos coloca cada vez mais longe dela. Não tenho as certezas metafísicas que a muitos consolam. Tampouco me seduzem as vaidades mundanas. Quanto a esse ponto, devo dizer que há algum tempo resolvi aceitar a sugestão de amigos e entrar para a academia. Não a de Letras, mas uma academia de ginástica. Se não me torna “imortal” (eu não morro pela “imortalidade”), ela certamente vai me propiciar mais alguns anos de vida.  

Acho, a propósito, que a não aceitação da morte é uma das maiores fraquezas humanas. Ela faz com que muitos nos iludam com a promessa de vida eterna (uma contradição em termos) e acaba separando as pessoas. Infelizmente, por interesses que a História é farta em mostrar, não fomos educados para a aceitação do nosso efêmero destino. Procuro aceitar o meu e espero que o desfecho esteja longe. Só não quero que se alongue demais a ponto de, para os que me circundam, eu passar de esteio a estorvo.  

Enfim, cada um se consola como pode, e disso faz parte escolher o suporte da sua crença – que, por ser crença, não é necessariamente a verdade. O importante é que se respeite a crença dos outros.

O melhor num momento como este é poder exaltar a família (o bem maior) sem que outros vejam nisso hipocrisia ou estratégia para arrebanhar votos; agradecer aos amigos a companhia, mesmo virtual, e o estímulo para continuar escrevendo; dirigir-se aos alunos com a humildade de quem reconhece neles os verdadeiros mestres, pois a gente ensina para aprender.

         Geralmente se pede a quem tem “experiência” um conselho para viver melhor. Eis o meu: é preciso não perder a capacidade de rir. Não que a vida seja uma piada – se for, será de mau gosto. É que o humor demonstra uma compreensão profunda da nossa condição e nos ajuda aceitá-la. Quem sabe rir não se queixa, não maldiz a si nem aos outros, não se insurge contra alguma potestade que porventura nos tenha criado. Estamos aqui por conta própria, e cabe-nos enfrentar isso da melhor maneira possível.


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O silêncio do inocente