quarta-feira, 14 de junho de 2023

Narrativas

 


“Narrativa” é hoje uma palavra-ônibus, ou seja, uma dessas que servem a muitos sentidos e intenções (mais intenções do que sentidos).

É uma especie de fakenews robusta, urdida com o propósito de desqualificar (outra palavra da moda) ou mais raramente reabilitar alguém. 

Seu sentido é mais negativo do que positivo, pois o que prevalece em “narrativa” é a ideia de uma versão falsa, mentirosa, criada por alguém para escapar de reprimenda ou punição. 

Ao embalo dessa palavra-ônibus, o indivíduo pode derrapar, capotar ou colidir (nem sempre com outra “narrativa”). Pode usá-la inapropriadamente, negando fatos ou buscando reabilitar, contra todas as provas, figuras execráveis do mundo político. 

O percurso do vocábulo “narrativa” constitui interessante matéria para os estudiosos dos campos semânticos. 

Nascido como uma espécie de derivação da “épica”, que pressupunha nobreza de espírito e valor heroico, ele acabou designando características totalmente opostas às que marcam os heróis das epopeias. 

Os protagonistas das “narrativas” de hoje são o mais das vezes figuras ladinas, animadas por propósitos escusos, ou capazes de atitudes vis e desumanas para se manter no poder.

Não adianta afagá-los ou querer livrá-los do julgamento devido. O mundo está suficientemente maduro para os reconhecer. 

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