Recebi com tristeza a notícia da morte de Heloísa Teixeira, que tive como professora quando fiz o Mestrado na UFRJ. As aulas ocorriam na Faculdade de Comunicação, na Praia Vermelha, e eram marcadas pela informalidade e o bom humor.
O clima era bem mais ameno do que o que imperava no prédio da Av. Chile, onde então funcionava a Faculdade de Letras e pontificavam figurões como Afrânio Coutinho, Eduardo Portela e outros.
Nos cursos de Heloísa tomei contato com a poesia da chamada Geração Mimeógrafo, que surgiu durante a década de 1970 como uma forma de resistência ao regime militar e produzia uma arte dita marginal.
Dessa geração faziam parte, e foram por nós estudados, poetas como Cacaso e Ana Cristina César, que editavam seus textos em mimeógrafos e procediam a variados experimentos linguísticos; era comum associarem o erudito ao popular. À expressão dos dramas pessoais, aliavam a preocupação com o momento que o País atravessava.
Heloísa foi uma defensora do movimento feminista. Via nele um meio de afirmação das mulheres no plano da sexualidade e da atuação político-social. À mulher cabiam outros papéis além dos de mãe e dona de casa, os quais lhe foram atribuídos pelo machismo hegemônico.
O contato com poetas ainda não incluídos no cânone acadêmico ampliou-me o conhecimento da nossa literatura. Foi enriquecedor perceber que, a par de Machado de Assis, Guimarães Rosa, Clarice Lispector e outros frequentemente trabalhados na academia, havia quem procurava inovar com precários recursos editoriais e uma radical entrega de si mesmo sem a presunção de sucesso ou glória.
Devo à mestra que acaba de nos deixar a percepção disso.
Quando fui seu aluno, ela tinha o sobrenome de Chico e do seu pai, Sérgio. Embora tivesse se separado, não retirara o “Buarque de Holanda” que adquiriu do ex-marido. Isso me despertava a curiosidade; sem conhecer direito a história, eu imaginava o seu parentesco com o autor de “A banda” (um ingênuo delírio de fã, como veem…).
Só muito depois ela decidiu mudar o sobrenome para “Teixeira” — segundo li, “como uma forma de resgatar sua identidade materna e homenagear sua mãe”.
Em entrevistas, relatou que “a decisão foi tomada após anos de reflexão sobre o papel da mulher na sociedade e a importância de valorizar a ancestralidade feminina”. A mudança teve, então, um valor simbólico. Refletia a coerência com os princípios identitários que pregava e se constituía em mais um elemento de afirmação pessoal.