Li que uma flor nasceu na estação
Estação Espacial Internacional. É uma flor do gênero das zínias e constitui o
primeiro espécime vegetal a nascer fora da Terra. Em 1982 os russos cultivaram
na estação Salyut 7 alguns arabidopsis, mas o feito que o astronauta Scott
Kelly acaba de conseguir parece mais expressivo, pois as zínias completaram seu
ciclo de desenvolvimento até florescer. Os cientistas da Nasa estão eufóricos,
e não é para menos.
Flores nascem todo dia, em jardins bem
ou malcuidados. Existem até as que rebentam em terrenos baldios, como por
geração espontânea; essas não impressionam nem comovem ninguém. Mas uma flor
numa estação espacial surpreende e tem um inegável valor simbólico. Mostra que
é possível cultivar a vida fora do nosso planeta e estimula o sonho dos que
acham possível deixá-lo um dia.
Pelas condições em que a Terra se
encontra, maltratada e poluída, chegará o momento em que viver nela se tornará
impossível. Entre os que têm essa opinião está o físico Stephen Hawking, que
num programa da BBC afirmou: “Apesar de a possibilidade de um desastre no planeta Terra em um
determinado ano poder ser bem baixa, isto vai se acumulando com o tempo, e se
transforma em quase uma certeza para os próximos mil ou dez mil anos". A
solução será abandonar nosso planeta-mãe e tentar colonizar outros.
O fato de uma flor ter nascido numa
estação espacial estimula bons prognósticos. Pelo aroma, a delicadeza, o
desenho caprichoso, a flor é um marco de beleza e renovação. Uma eclosão de
esperança. Os poetas, particularmente, são atentos ao seu valor simbólico. Para
representar o sonho de paz num mundo transtornado pela guerra, Drummond escreveu
que “uma flor rompe o asfalto”.
Ela representa a vitória da fragilidade
sobre a prepotência. É uma nota de lirismo num ambiente em que os corações
padecem de melancolia e aridez. Foi com flores que o movimento hippie se propôs
a enfrentar a ânsia aquisitiva de um mundo fascinado por sucesso e dinheiro.
Para tentar moderar os excessos do capitalismo, elegeram-nas como instrumento de conclamação à paz e ao amor.
Esperemos que a for nascida na estufa da
estação espacial seja também um aceno de convivência harmônica entre os homens.
Depois dela, que é um organismo vegetal, chegará a vez do organismo
animal. O aparecimento da vida em
condições de microgravidade abrirá o caminho para que ela ocorra em condições
ainda mais adversas. Quem sabe, em outros planetas.
O triste de pensar nessas coisas é que a Terra
parece cada vez menos florida. Em muitas de suas regiões, o pântano chamado
miséria soterra crianças, pobres e outros tantos desvalidos. Chega a ser um
acinte falar em exploração espacial, com todo o dinheiro que isso demanda,
quando muitos mal têm o que comer, beber ou vestir. Para esses a Terra já se
tornou inabitável, e não há nenhuma perspectiva de fuga. O que significa, para
eles, a zínia que floresceu na estação espacial? Nada. Ela é tão distante
quanto lhes é próxima a ameaça da zica, a doença que reduz o cérebro de suas
crianças.
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