domingo, 5 de junho de 2016

Carta a Berta

Querida Berta:

Estou pensando seriamente em deixar o País. Qualquer alternativa (com exceção da Venezuela, claro) é melhor do que isto aqui. As coisas andam muito confusas. Só para lhe dar uma ideia: o presidente em exercício (a gente fala assim, embora não saiba que atividade física ele pratica) não consegue “fechar” o novo ministério porque, entre os indicados, um ou outro tem problemas com a Justiça. Ou ele não sabe quem está escolhendo, ou lhe faltam mesmo opções.
         Dizem que acertou na equipe econômica e está errando no resto. Inclusive no português, pois precisa se tornar simpático ao povo mas abusa das mesóclises. Ele parece não saber que o povo rejeita esse tipo de construção (assim como não gosta do “cujo”). A mesóclise, além do mais, é de péssimo augúrio; faz lembrar “o homem da vassoura”, aquele que renunciou devido a forças ocultas, lembra?
Se continuar errando, o presidente (em exercício, ufa!) não vai emplacar. Com isso, terá que devolver o cargo à... presidenta (não sei se é pior pronunciar essa palavra ou ouvir um “sê-lo-á”). Para alguns, isso seria um contragolpe, mas o Brasil é assim mesmo; golpeia hoje e sofre o revide amanhã.
         Você é que é feliz morando aí. Não tem que acompanhar as idas e vindas do novo governo e o temor dos políticos, que estão em polvorosa por causa da Operação Lava-Jato. A maioria deles já não dorme ou, se dorme, acorda sobressaltada com medo das delações (cada vez mais frequentes) e do juiz Sérgio Moro (que, ainda por cima, só se veste de preto). Muitos não sabem se no dia seguinte estarão num carro oficial, rumo ao trabalho, ou num avião com destino a Curitiba.
          Vou ficando por aqui, pois preciso ir para a cama antes da próxima edição do jornal. Se tiver que acompanhar mais uma daquelas transcrições de fitas gravadas, certamente vou me irritar e perder o sono. Não pelo que elas revelam, mas pelas surradas justificativas dos acusados.
       Escreva. Levando em conta o que acontece neste país, qualquer notícia que você mande servir-me-á (meu Deus, estou me contaminando!) de refrigério e deleite.

       Abraço do seu
       Nicanor.

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O poder da frase