Chegou a época do amigo-secreto. Esse
tipo de brincadeira faz parte do calendário
de fim de ano, quando também se comemora o Natal, e constitui uma tentativa de
aproximar as pessoas. No duro exercício de conviver, elas passam doze meses entre
rixas que as desgastam e entristecem. É preciso uma pausa, um armistício, um
oásis em que possam refrescar o espírito com os ventos da tolerância e do bom
humor.
Nem todo mundo vê sentido em dar
presentes aos outros por sorteio. Muitas vezes se tem que passar pelo constrangimento
de presentear um desafeto, ou mesmo alguém pelo qual se tem antipatia. Quem “tira”
o chefe, então, perde o sono pensando se o que vai dar a ele o agradará. Um
presente errado pode custar a demissão.
Presentear exige tato (e às vezes
cheiro, no caso de o presente ser um perfume). Deve-se ter cuidado para não cometer
gafes como a de dar uma caixa de chocolates a um diabético; meias de lã a quem
tem alergia a esse tecido; ou um disco de pagode a um cultor de música
clássica. Como nem sempre é possível sondar o gosto do presenteado, falhas como
essas certamente vão ocorrer e poderão transformar o amigo secreto num inimigo
declarado.
O nível dos presentes deve cair muito
este ano por causa da crise. Fala-se até que os bancos estão criando uma linha
de crédito para financiá-los. Caso nem isso resolva, haverá duas opções:
reciclar o que se recebeu em anos anteriores ou romper a amizade até, pelo
menos, depois do réveillon. Como a segunda opção é muito radical, a maioria
deve mesmo apelar para a reciclagem.
Caso você se decida por reciclar, tome
alguns cuidados. Não se esqueça, por exemplo, de substituir o papel do
presente, que após um ano deve estar amarfanhado. Uma embalagem estalando de
nova dará ideia de um conteúdo original.
Além disso, confira se no presente
anterior havia um cartão com um oferecimento endereçado a você. Imagine seu
atual amigo se deparar com o cartão e desvendar a farsa! Há quem por preguiça
aproveite os dizeres e mude apenas o destinatário e a assinatura. Não o
aconselho a fazer isso, pois muitos valorizam mais o cartão do que o presente;
uma mensagem caprichada impedirá que avaliem o que ganharem.
Outro cuidado – este importantíssimo! –
é ver se não está destinando o mimo (detesto essa palavra, mas não posso mais
repetir “presente”) à pessoa da qual o recebeu. Isso às vezes ocorre, por
distração. Certamente acontecerá muito este ano, pois com a crise (sempre ela!)
as pessoas ficam preocupadas e mais distraídas.
Na ocasião de entregar os presentes, deve-se
dirigir ao presenteado algumas palavras que possam defini-lo. O objetivo é dar pistas
para que os outros adivinhem de quem se trata. Por exemplo: “Ele é atencioso, colaborador,
não deixa os colegas na mão...”. “Ela é muito emotiva e gosta de contar
piadas...”. Se a descrição for adequada, o pessoal vai gritar “Erundino!”, que
é atencioso, colaborador e, pelo menos até agora, não deixou ninguém na mão. Ou
“Santelma!”, conhecida por chorar fácil e ser engraçada (segundo as más
línguas, uma bipolar).
Mas, e se o amigo oculto só tiver
qualidades negativas? Se for um desses sujeitos intragáveis que toda a repartição
odeia? Nesse caso ou você o recusa (e se prepara para as consequências caso
isso chegue aos ouvidos dele) ou tem que partir mesmo para a hipocrisia. Por
exemplo: se no sorteio lhe couber “Arnildo”, um rematado puxa-saco, diga que ele
é “fiel, dedicado, amigo do chefe". Os colegas disfarçarão um risinho, claro, mas
vão acabar entendendo.
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