sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Divagando se vai longe (2)

Quando eu era pequeno, ouvi falar de um “paletó para homem lascado atrás”. As pessoas diziam isso e riam. Eu, claro, não conseguia entender. Sempre me lembro dessa frase quando penso na hipálage, figura sintática que representa um “deslocamento de atribuição”.
A hipálage pode ser um recurso literário, como nesta passagem: “Fiquei olhando o voo branco das garças”, em vez de “O voo das garças brancas”. O deslocamento do adjetivo “branco” (de “garças” para “voo”) enriquece visualmente a imagem.
Voltando à minha lembrança. O normal é: “paletó lascado atrás para homem”. O problema é que, nessa ordem, desfaz-se a malícia -- e com ela, a graça.
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Foi preciso mais de 100 presos morrerem em chacinas para se concluir que o maior problema dos presídios brasileiros é... a burocracia. Propõe-se agora soltar os que não deveriam estar mais atrás das grades.
O medo é que o velho “jeitinho” exerça aí o seu papel e se acabe mandando para a rua mais gente do que o desejável.
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Segundo Voltaire, o segredo de aborrecer é dizer tudo. Dizer tudo, além de deixar o leitor impaciente, tira-lhe o prazer de compreender por si. É uma forma de subestimar sua inteligência.
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Não tenho nada contra quem pinta o cabelo. É louvável o esforço de querer parecer mais jovem, driblar os anos. O problema é que às vezes se carrega na tinta. O ideal seria esconder o artifício, negar que o tingimento é fingimento. Como não se faz isso, o efeito algumas vezes chega a ser patético. 

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O silêncio do inocente