I
Num domingo à tarde, ela abriu a torneira do gás e se
matou. Ninguém soube o motivo.
Entre suas coisas, encontraram um Guia de Viagem
amarrotado e notas de euro dentro de um envelope.
Estava juntando havia algum tempo. Sonhava um dia
conhecer Paris.
II
Resolveu
tomar satisfação com o sujeito que a olhava:
-- Que é
que há? Me assediando? Sabe que isso dá
cadeia? Eu posso te denunciar!
Assustado,
amolece o corpo e a voz:
-- Que
nada, querida. Fiquei vidrado em seu modelito. Combina com a blusa. Mas eu em
seu lugar escolhia um amarelo mais vivo.
“Um
entendido” – ela pensou. Mas então por que o olhar fixo nas suas pernas?
Confusa, resolveu deixar pra lá.
-- Tudo
bem. Mas vê se sai de cima do muro, pô.
III
Ninguém
suportava Albanor. Convencido e pernóstico. As clientes só o procuravam porque
era um bom costureiro.
Na
antessala do ateliê, o comentário:
-- Só quer
ser as pregas!
E Alaíde,
a mais ferina:
-- Que ele
não tem mais.
IV
Joquinha nas
últimas, um fio de vida. Ao lado, aflita, a esposa:
-- Homem,
pelo amor de Deus! Decida-se!
Joquinha
calado.
-- Se
morrer assim, você corre o risco de ir para o inferno. Acredita ou não em outro
mundo?
A
resposta, num murmúrio:
-- Decido
no caminho.
V
Na classe o chamavam de Patinho e Empenado. Evitava os
colegas com medo de ouvir coisa pior (se soubessem, por exemplo, do sinal vermelho
na altura do ombro).
Um dia o professor leu a sua
redação em voz alta e lhe fez um elogio.
Não soube como
reagir. Pensava que era brincadeira.
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