Querida Berta:
Estive ausente por uns dias, mas não me
esqueci de você. É que houve uns problemas aqui em casa e tive de arregaçar as
mangas (não para resolvê-los, mas para não me sujar). Primeiro veio um
entupimento no vaso sanitário. Depois o teto da cozinha apareceu com um vazamento
que fazia a água descer pelas paredes e danificar o piso.
Parecia que estávamos na Vila Olímpica
do Rio, e sem aquele batalhão de encanadores, eletricistas e pedreiros para resolver
o problema. Com a grana curta, Celeste teve de apelar para um funcionário que
trabalha para a mãe dela; Dona Zeferina mandou-o de má vontade e ainda me
criticou (minha sogra nunca me engoliu, embora tenha tentado isso mais de uma
vez quando ninguém estava olhando). Deve ter aproveitado o pretexto para lembrar
à filha que ela não deveria ter se casado com um joão-ninguém...
Mas os problemas foram resolvidos,
felizmente, e a vida voltou à normalidade. “Bolsonaro” está magrinho porque não
tem se alimentado bem. Com alto o preço da carne, está sendo impossível deixar todo
o osso para ele. Quando rosna, faminto, tento explicar-lhe que o culpado não
somos nós, e sim a crise.
Por
falar em crise (e é só no que se fala), dentro de poucos dias se resolverá o
problema do impeachment. Celeste, com a sua velha queda pela esquerda, aderiu a
um grupo no Facebook intitulado “Fora,Temer”. Perguntou se eu queria participar.
Embora isso pudesse melhorar o clima entre nós, fazendo-a pelo menos abrandar a
greve de sexo, respondi que não. O “Fora, Temer” poderia dar a entender “Volta,
Dilma”, e eu não queria correr esse risco.
Os partidários da “teoria do golpe”
querem que a presidente afastada compareça com o presidente em exercício à
cerimônia de abertura dos jogos. Já tem gente apostando para saber quem levará
a maior vaia. Ainda bem que não se está pensando em bater panelas; se isso
ocorresse, ninguém ia suportar o barulho num momento em que é tão importante
escutar o Hino Nacional (escutar, pelo menos, já que ninguém sabe mesmo
cantá-lo). Além do mais, bater panelas seria péssimo para a imagem do País quando
o feijão (principal ingrediente na mesa dos brasileiros) está pela hora da
morte. Não se pode prever como a comunidade internacional ia interpretar isso.
Felizmente a Olimpíada começa na próxima
semana e nos fará sair um pouco do baixo-astral trazido pela crise. Vai ser
animado acompanhar o movimento dos turistas, o desembarque das delegações, a
chegada dos chefes de Estado. Entre eles François Hollande, que ultimamente só
tem assistido a minutos de silêncio. Talvez agora se alegre um pouco,
principalmente se a França (hélas!) conquistar medalhas.
Despeço-me
por hoje. Que a Olimpíada transcorra sem atentados e a única explosão que a
gente escute seja a dos gritos da nossa torcida. Essa explosão verde-amarela
fará bem a um país que ainda está no vermelho.
Abraço olímpico do seu
Nicanor.
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