Amsterdã
é um caos ordenado. Caminhões da limpeza urbana invadem as calçadas, mas não nos
deixam chateados com isso. O pessoal está fazendo com educação um trabalho que
vai ajudar o trânsito dos pedestres em seu embate com as bicicletas.
É
mais fácil ser atropelado por uma delas do que por um Tram, que afinal tem um
trajeto predefinido. As bicicletas, não. Existem as ciclovias, que praticamente
cortam a cidade, mas essas nem todos os ciclistas respeitam (muito menos os
turistas, que são muitos).
Como
estivemos por lá em tempo chuvoso e frio (cerca de 8° C), não deu para apreciar
a beleza dos canais. O escuro das águas e a densa neblina impediam isso.
Concentramos
então o passeio na Praça Dam e seus arredores. Apesar do clima, a praça estava
cheia de turistas e daquela “fauna” característica da cidade (destaque para os jovens
estilosos com suas tatuagens e para os religiosos vestidos a caráter).
Vez
por outra uma revoada de pombos respondia ao perfurante barulho de uma
ambulância que levava alguém para o hospital. Não fosse pelos pombos, que
ofereciam um belo espetáculo visual e auditivo, talvez ninguém notasse.
Uma
das marcas de Amsterdã é a liberdade, que se expressa, por exemplo, no
reconhecimento profissional da prostituição. Enquanto circulava por ruas do
Bairro da Luz Vermelha (acompanhado da minha esposa, ressalto!), pude ver as
mulheres que se exibiam em janelas ou vitrines – algumas bonitas, outras não;
algumas jovens, outras perto de dar entrada no pedido de assistência que o
Estado oferece às já desprovidas de encantos para exercer o ofício.
O
que senti circulando no Bairro da Luz Vermelha foi um movimento pouco
condizente com a natureza do comércio que se realiza por lá. Sou um romântico e
acho que, mesmo no amor pago, deve-se preservar uma nota de discrição e um tom
de meia-luz.
Millôr
escreveu que “turismo é prostituição”, tendo em vista que por meio dessa atividade
se vendem a estrangeiros alguns dos valores mais caros e íntimos de um
lugar. Caminhando por aquela zona de Amsterdã, ocorreu-me uma inversão da
frase: “prostituição é turismo”. Enquanto acompanhava os curiosos, eu me perguntava
se aquela ostensiva exposição da mais antiga das profissões não subtraía o que
nela deveria haver de atraente e misterioso.
O
comportamento dos jovens é outro dado que atesta a liberdade dos costumes na
capital da Holanda. Um dos símbolos disso é a propaganda da cannabis, que não
se encontra apenas nos cigarros. Aparece também em pastilhas, biscoitos,
pirulitos, prometendo aos degustadores relaxamento e um pouco de paz. Uma “brisa”,
como eles costumam dizer.
O
problema é que, por falta de medida, essa “brisa” pode se transformar em
vendaval. Foi o que vimos quando voltávamos para o hotel, à noitinha, e nos
depararmos com uma cena patética e dolorosa: num grupo de três adolescentes,
uma delas procurava segurar a colega que bambeava e acabou, apesar dos esforços
também da terceira, se esborrachando no chão. Afastamo-nos um pouco assustados,
vendo as duas tentando reanimar a mais inebriada.
Enfim,
coisas de uma cidade que, além da erva, tem tulipas e moinhos. As primeiras não
conseguimos ver agora, pois só florescem no mês de abril, mas há delas
reproduções nas inúmeras tendas que se estendem pelas calçadas; as mulheres do nosso
grupo compraram algumas. Quanto aos moinhos, ficou deles a lembrança de outra
estada, em 2018, quando pudemos apreciá-los num bate e volta para Zaanse
Schans.
Meu sonho é que as duas experiências se
repitam.
Nenhum comentário:
Postar um comentário