A série “Cem anos de solidão”, que estreou recentemente na Netflix, faz jus à obra-prima que lhe deu origem. Reproduz com primor os eventos, a atmosfera e os conflitos presentes no romance, que transcende do realismo para captar a experiência e o imaginário de uma família latino-americana e sua descendência.
Jose
Arcádio Buendía, o patriarca da prole, é um visionário que pretende descobrir
por meio de confusos experimentos alquímicos os segredos e as leis da Natureza.
Influenciado pelo cigano Melquíades, perde noites buscando entender o enigma da
vida e da morte. Enquanto isso, os membros da família se dispersam dentro e fora
de casa, dando curso aos instintos sexuais (alguns incestuosos), ao enseio utópico
de outras terras ou à obsessão revolucionária. De um modo ou de outro, a violência
permeia esses comportamentos.
Chama
a atenção na série o trabalho dos atores, de uma impressionante homogeneidade –
com destaque para as atrizes que interpretam a personagem Úrsula. Delas emana
uma fortaleza e uma convicção condizentes com o papel de esteio da família. São
paradigmas da mulher que se impõe pelo discernimento e a sensatez num cenário
de homens tíbios ou tresloucados.
Outro
mérito está na direção, que orienta a câmera pelos desvãos da casa como se quisesse
ressaltar que ali é um micromundo e, obviamente, espelha um cenário bem maior. Concorre
para a beleza plástica do filme a alternância entre esses movimentos e a
fixação da câmera em quadros cuja cenografia é rica de significados. É como se a
direção pretendesse que o espectador neles se detivesse para melhor captar a
inter-relação entre o ambiente e a psicologia dos personagens. Os quadros valem
por si.
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