Tenho
lido críticas por parte de estudiosos da língua ao uso de “Gratidão” no lugar
de “Obrigado”. Alegam que esse é um caso de pedantismo e não deve substituir a
forma clássica com que nos acostumamos a reconhecer um favor. “Gratidão”, de fato,
soa um tanto pomposo. É como se, com a escolha do substantivo, o favorecido quisesse
enfatizar o sentimento e não simplesmente mostrar que dele está imbuído.
– Já que você não pôde ir para o almoço,
vim aqui lhe trazer uns sanduíches.
– Gratidão.
Vejam que o beneficiário, ou
beneficiária, não se limitou a mostrar-se agradecido(a). Evocou o que no ser
humano é uma manifestação de grandeza de alma. Escolhendo o substantivo, leva o
receptor a preencher todo um contexto elíptico (“Diante do favor que me fez,
demonstro-lhe minha...”). Convenhamos em que isso torna o diálogo um tanto
solene e pouco natural.
Risque-se então “Gratidão”, estou de acordo.
Mas por que usar necessariamente “Obrigado”, e não “Grato? Este é sintético, franco, e não sugere nenhum
prévio compromisso da parte do favorecido.
No “Obrigado”, como se sabe, o contemplado
“se obriga” ao dever da retribuição. Confessa-se compelido a retribuir o favor
mesmo que não esteja sendo sincero. Fala mais por um dever social do que por um
impulso espontâneo, que traduza o reconhecimento pelo benefício recebido.
As
coisas que fazemos por obrigação nem sempre são prazerosas. Quem já não ouviu
de alguém a justificativa de que “fez porque foi obrigado”, ou seja, de
que agiu de determinada maneira porque não tinha alternativa? Por que
transferir essa possibilidade ao domínio das gentilezas e dos favores?
Se “me
obrigo” diante de alguém, tenho-o como credor ou juiz – tipos sociais que não nos
acostumamos a ver com simpatia. O primeiro nos cobra, o segundo nos julga, e
ninguém se sente à vontade quando submetido a tais injunções.
Sei
que a sociedade se rege por obrigações de uns para com os outros. Mas não fica
bem estendê-las ao domínio das reações espontâneas e afetuosas, como as que
experimentamos diante de quem nos presta um favor ou concede uma graça.
Não
vou deixar de dizer “Obrigado”, que já é um clichê e cujo esvaziamento
semântico vem se estendendo ao plano morfológico. Tanto é assim que o empregam
tanto homens quanto mulheres (para desespero dos adeptos da linguagem neutra,
que escolheriam “Obrigade”).
Mas
confesso que prefiro mesmo “Grato”, que não comporta nenhum dever retributivo e
tem o mesmo étimo de “Gratidão”. Além do mais, sendo um adjetivo, enfatiza o
estado do beneficiário e não “a substanciosa” grandeza do sentimento. Sem falar
que ganha da concorrente pela extensão. Os manuais de estilo, como se sabe,
recomendam o uso de palavras curtas, e por esse critério o dissílabo “Grato” é
preferível ao polissilábico “Obrigado”.